Introdução: rompendo com o passado ornamental
A partir de 1930, o Brasil passou por um movimento arquitetônico revolucionário que buscava romper com os excessos decorativos do ecletismo colonial e adaptá-los a um estilo funcional, limpo e cosmopolita. Esse novo paradigma — o Modernismo — estava diretamente ligado às ideias de racionalismo, clareza estrutural e articulação entre forma e função, sintetizando-se em uma arquitetura funcional, inovadora e nacionalmente autêntica.
A Semana de Arte Moderna e o espírito inovador
Em 1922, embora tenha ocorrido no campo das artes visuais, a Semana de Arte Moderna no Rio de Janeiro foi o ponto de partida para uma nova atitude estética e intelectual que influenciou a arquitetura. Defendeu uma linguagem moderna na arte e na própria construção do país. Nos anos seguintes, arquitetos começaram a revisitar os cânones europeus, principalmente os relacionados ao movimento Bauhaus e às ideias de Le Corbusier.
Pioneiros e o contexto internacional
Dois protagonistas nacionais se destacaram nessa virada:ificação à ciência dos materiais, à construção lógica e à tecnologia. Le Corbusier, com seu conceito de “casa‑promenade” e as famosas pilotis, despertou a imaginação de arquitetos brasileiros que começaram a desconstruir colunas, aberturas e fachadas.
O paulista Gregori Warchavchik, naturalizado brasileiro, é considerado o precursor da arquitetura moderna no Brasil. Em meados dos anos 30, construiu casas cubistas com pilotis, platibandas e janelas em fita — já totalmente inspiradas na tradição modernista europeia.
Marcos da transição: o Edifício Gustavo Capanema
Em 1936, foi concluída a sede do Ministério da Educação e Saúde — o Edifício Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro. Projetado por Lúcio Costa, com participação de Oscar Niemeyer, Le Corbusier e vários contratados, o prédio foi inaugurado como o marco inicial do racionalismo brasileiro. Com estrutura em concreto armado, brises‑soleil funcionais e pilotis, substituiu ornamentos por elementos estruturais.
Além disso, o interior teve frescos de Portinari, trazendo uma integração entre arquitetura moderna e arte nacional em grande escala. O edifício trouxe ainda o uso inteligente de volumes suspensos, colunas aparentes e espaços abertos — elementos que se tornariam essenciais na linguagem modernista nacional.
Casas modernistas e residências em evolução
O estilo moderno foi rapidamente absorvido por engenheiros e arquitetos. As casas modernistas representavam essa transição de linguagem: foram erguidas em São Paulo, Santos, Rio e capitais do Centro‑Oeste. Os projetos incorporavam planta livre, grandes esquadrias de vidro, integração interno‑externo e ausência de ornamento desnecessário.
Essas residências enfatizavam funcionalismo sem perder elegância, e introduziram uma arquitetura leve e adaptada ao clima tropical — com brises, cobogós e piscinas como parte integrante do projeto. Foi justamente nesse ambiente que nasceu grande parte do repertório modernista aplicado em escala doméstica.
Oscar Niemeyer e os contornos sensuais do concreto
Na década de 1940 e 1950, Oscar Niemeyer elevou o modernismo a um patamar único, incorporando curvas orgânicas e liberdade formal ao repertório modernista racionalista. Suas obras — como a Casa das Canoas, no Rio, e milhares de móveis de linhas sinuosas — fugiam do quadrado neutro, mostrando que o concreto poderia expressar leveza, sensualidade e brasilidade.
Em parceria com Lúcio Costa, participou da criação do plano piloto de Brasília — a construção da nova capital, inaugurada em 1960, elevou o modernismo a um símbolo nacional. Suas formas escultóricas — Catedral, Palácio do Planalto, Palácio da Alvorada — tornaram-se expressões emblemáticas do Brasil moderno em forma e espírito.
A Escola Carioca e a formação de arquitetos
A partir dos anos 40, surgiu a chamada Escola Carioca, que incluía generações de arquitetos como Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira e José Carlos Sassi. Eles foram responsáveis por importantes edifícios residenciais, culturais e institucionais que mesclaram princípios modernistas com preocupações climáticas e urbanísticas.
Exemplos emblemáticos incluem o conjunto arquitetônico do Museu de Arte Moderna do Rio e conjuntos residenciais voltados ao bem-estar dos moradores, com áreas verdes, ventilação cruzada e integração com o entorno. Foi nesse momento que uma variação tropical e urbana do modernismo foi consolidada.
Declínio e transição para o pós‑Modernismo
No início dos anos 60, o Modernismo puro já era visto como rígido e frio demais. A arquitetura começou a abrir ao pós‑modernismo, que buscava reinterpretar o ambiente urbano com referências históricas, cores mais vivas e modulação mais humanizada. No entanto, mesmo com essa transição, muitos edifícios modernos continuaram a figurar como monumentos históricos.
Legado e importância
A revolução racionalista modernista mudou radicalmente a arquitetura brasileira: introduziu a ideia de planta livre, aproveitamento da luz natural, leveza estrutural e integração com o clima e cultura nacional. Tornou-se a base para o urbanismo, a arquitetura social e as cidades planejadas.
Hoje, milhares de edifícios projetados por essa geração carregam relevância estratégica — como espaços culturais, instituições governamentais e moradias. Tornaram-se parte importante do patrimônio nacional, preservados e estudados, servindo como modelos para a arquitetura contemporânea.
Entre 1930 e 1960, o modernismo trouxe ao Brasil uma revolução baseada em racionalidade, tecnologia e sensação de pertencimento nacional. De casas domésticas a planaltos monumentais, o movimento implantou uma estética funcional e orgânica, que continue a exercer influência nas práticas atuais.